Sìndrome do pixel


Que os telefones celulares são um aparato muito dinâmico em que fazer e receber chamadas são somente algumas dentre suas inúmeras funções é de conhecimento de todos, porém será que estamos realmente conscientes das transformações que esta multifuncionalidade tem causado em nosso cotidiano?

É através da telinha destes aparelhos que trocamos torpedos, enviamos email, acessamos o facebook, tiramos foto, gravamos vídeos. Milhões de pessoas dedicam boa parte de seu tempo a relacionar-se com outras pessoas ou ambientes através dos inúmeros recursos que eles dispõem.

Há, nos EUA, hotéis com cofres para guardar celulares Blackberry, mantendo-os longe de seus donos. O espaço funciona como uma espécie de spa, onde as pessoas vão para disfrutar da liberdade de desconectarem-se temporariamente, abrindo mão do aparelho que é quase uma extensão de seus corpos. Neste contexto, há diversas situações que nos alertam para os perigos da dependência de equipamentos eletrônicos como estes, mas uma delas me chama atenção em especial.

Trata-se da síndrome do pixel.

Segundo definição da Wikipedia, um pixel é “o menor ponto que forma uma imagem digital, sendo que o conjunto de milhares de pixels forma a imagem inteira”. Estes milhares de pontos estão presentes em todas as telas de computadores, celulares e televisores que conhecemos. Naturalmente, o olho humano não gera imagens através de pixels. O processo de formação da imagem no cérebro humano se dá por meio do contato direto com a luz oriunda dos objetos visíveis e de seguidos estímulos neurais.

Estimular os olhos com a luz oriunda de um objeto visível como a cabeça, tronco e membros de um Chico Buarque é um dos principais fatores que, imagino eu, impulsiona um fã a pagar o alto preço que custa um ingresso para as suas bissextas aparições nos palcos.

Ora, se a diferença entre sentar na poltrona reclinável da sala de estar para assistir a um DVD do mesmo conjunto de cabeça, tronco e membros tocando e cantando suas canções e pagar caro para ver a mesma coisa, de pé e em meio a um amontoado de gente, é, justamente, a eliminação dos pixels que interpõem-se entre o objeto e os olhos humanos, por que as pessoas insistem em seguir utilizando estes famigerados aparelhos como se lentes corretivas de visão fossem?

É a síndrome do pixel, meus caros. Estamos enfermos, doutrinados pela máscara virtual da evolução tecnológica.

As pessoas estão tão acostumadas a passar grande parte de seu tempo diante de imagens virtuais de convites para jantar e declarações de amor, do sorriso dos filhos e programas de humor, de debates fervorosos e “curtir” do facebook, que os olhos humanos estão atrofiando-se e perdendo o encantamento pela luz direta oriunda dos objetos visíveis como a de um pôr do sol de domingo, enquanto deslumbram-se cada vez mais pela foto emoldurada do mesmo pôr do sol na mesma sala de estar da poltrona reclinável.

Observem nas próximas apresentações culturais, concertos e lugares turísticos que vocês forem que grande parte das pessoas dedicam mais tempo a registrar virtualmente aquilo que foram para ver, do que a vê-los diretamente.

Ver. Direcionar os olhos, mantê-los abertos. Ver…

Muito em breve, terão que lançar celulares que choram.

Sobre Renan Silva

Renan Silva - Arquiteto / Urbanista - Mestre em Planejamento para do Desenvolvimento Local - Especialista em mobilidade urbana - 31 anos - Time do coração: CRB
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2 respostas para Sìndrome do pixel

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  2. Larissa disse:

    Muito bom! Vc tinha tratado do assunto naquele post sobre o jogo na Espanha, gostei dos dois textos. E concordo!

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